Tradicionalmente
a arte tem sido vítima da ignorância, agora
também sofre com a violência explícita, pública e notória. Se a indgnação não se manifestar, o horror da
brutalidade nos transformará em silenciosos e coniventes covardes.
A nota que circula na internet é: “-A produção do Caju na Rua vem informar que na madrugada desta sexta - feira, o caju do artista Edidelson que estava localizado no final da passarela do Caranguejo na Orla da Atalaia foi vandalizado. Populare...
A nota que circula na internet é: “-A produção do Caju na Rua vem informar que na madrugada desta sexta - feira, o caju do artista Edidelson que estava localizado no final da passarela do Caranguejo na Orla da Atalaia foi vandalizado. Populare...
Não costumo
escrever artigos na primeira pessoa, porém, sendo eu também uma vítima e
testemunha de outros casos escabrosos semelhantes a este, sinto-me impelido a
narrar na primeira pessoa, protestar e me imaginar nas peles de Edidelson Silva
e de Fábio Sampaio. Assim, esta minha atitude não se enquadra simplesmente no
caso de “comprar a briga dos outros”. Na década de setenta, quando eu trabalhava
no SENAI como professor e pintava por hobby, a bibliotecária não me deu sossego
até eu lhe doar uma tela com um tema bem pitoresco. Cerca de três meses depois,
um colega, o Izaias que, por amizade foi a sua casa fazer um pequeno conserto
elétrico, percebeu que a tela estava largada junto às vassouras, atrás da porta
do quintal. Décadas depois, já no ano 2010, outro amigo, Gilson Ramos me informava
que, o seu irmão encontrou no lixo a citada tela em perfeito estado. No mínimo,
tinha ele achado ali dois mil reais, que seria o preço da tela no mercado de
arte local. Enquanto estive como diretor
na GAAS - Galeria de Arte Álvaro Santos, entre os inícios de 2001 e 2005,
chegaram até lá dois casos de obras de artistas, já consagrados, Adauto Machado
e Leonardo Alencar, que foram parar nos monturos. Quem as achou - um deles, por
acaso também artista plástico, o gaúcho Eduardo Fabião, ao alugar uma casa no
centro - ao mesmo tempo em que ficaram tristes diante da ignorância dos
perdulários, faturaram. Após deixar a GAAS recebi um telefonema de uma senhora
que solicitava o meu aval. Seria uma espécie de parecer artístico para
justificar perante órgãos como o IPHAN, a retirada de um painel de Leonardo
Alencar da Igreja de São José. Claro que declinei de tal poder. Ainda que o
tivesse de fato, propositadamente não o faria. O motivo, eu soube depois, era o
fato de ser um painel de características bem contemporâneas e os católicos queriam
uma obra no estilo neoclassicista. Ainda tem gente que só considera arte a
Greco-romana. Também em pleno século vinte e um, uma escultura em aço
inoxidável com mais de dois metros e meio de altura, que eu repassei para um
semanário num escambo, resultado de serviço prestado pelo dito, foi parar num
ferro velho por ter sofrido uma avaria perfeitamente sanável. Fosse eu fazer
aquela escultura hoje, somente os custos ficariam em quatro mil reais. Nestes
episódios se nota claramente a ingratidão enquanto contrapartida, dada à
indiferença ou ignorância, quando deveria haver o reconhecimento das habilidades
e do desprendimento dos artistas além do valor dos seus feitos.
Agora,
no caso do Caju de Edidelson, da primeira edição do projeto Caju na Rua, criado
por Fábio Sampaio, fica claro que não se tratou da mera ignorância, mas, de
violência intimidadora; a conhecida brutalidade física como um ato simbólico;
um ritual de feições macabras a mandar um recado: o caju teve apartada a sua
castanha como se decepa uma cabeça humana do corpo. Neste contexto, o
ingrediente mais animador dos bárbaros contemporâneos de Aracaju parece ter
sido o reacionarismo estúpido vindos de doutrinação odiosa. Deixaram sinais de
que foi pensada e posta em prática uma ação para destruir um ícone, que
representava uma entidade, filosofia, ideologia ou uma pessoa. Se esta leitura que eu faço deste episódio estiver
errada, de outra forma, só cabe dizer que, quem o fez exercitou a ingratidão. Munido
da ignorância qualquer indivíduo está preparado para exercitar plenamente a
empáfia, o preconceito, a intolerância e a ingratidão. Enquanto nós artistas nos
esmeramos em construir obras de arte para realçar a cara da cidade, compor a sua
identidade artística e sociocultural há quem a destrua de diversas formas. Caso
a população esqueça a reciprocidade, fique indiferente e vá se habituando a
gestos insanos com estes, a ingratidão, esta vilania até entre os indivíduos
mais íntimos, terá se generalizado como uma praga.
Antônio da Cruz